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Por: Elisa Albuquerque Maranhão Rego

Procuradora Municipal de Camaragibe/PE. Advogada, sócia-fundadora do escritório Marcon, Wolmer & Maranhão Advocacia. Mestra pelo Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Pernambuco (PPGD/UFPE).  Publicado no jornal Diário de Pernambuco no dia 3 de março de 2021.

Não é novidade, já há muitos anos os incentivos fiscais federais concedidos em face de tributos que se submetem a repartição constitucional de receita tributária, como o IR e IPI, vêm repercutindo gravemente sobre os Fundos de Participação Estadual e Municipal, comprometendo o orçamento dos estados e municípios. Nestes casos, a concessão de incentivos fiscais não causa apenas redução da arrecadação tributária da União. Perceba-se que a ausência de arrecadação destes tributos também atinge os orçamentos dos estados e municípios, os quais, apesar de não participarem das diretrizes da política fiscal exoneratória, suportam de fato grande parte do reflexo dos gastos tributários federais. Vejam-se os dados. No importante Acórdão n° 713/20141, o Tribunal de Contas da União (TCU) realizou fiscalização, na modalidade acompanhamento de conformidade (Registro Fiscalis 526/2013), analisando a renúncia tributária, concedida a partir do exercício de 2008 em face do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza (IR), bem como seu impacto na repartição de receita tributária, especialmente, nas transferências dos Fundos de Participação dos Estados (FPE) e dos Municípios (FPM). O TCU apurou que, entre 2008 e 2012, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios arcaram com 58% do valor total das desonerações concedidas pelo Governo Federal, equivalente ao montante de 190,11 bilhões de reais, em face de 42% arcados pela União, correspondente a 137,67 bilhões de reais. Ou seja, mais da metade das desonerações determinadas pela União foram efetivamente suportadas pelos estados e municípios. Nada obstante a crise pandêmica instalada em todo o mundo diante da COVID-19, permanece em franca ascendência a concessão de exonerações fiscais. Na última década, os valores dos gastos tributários só fizeram aumentar. Em 2013, os incentivos fiscais federais alcançaram a monta de R$ 223.310.466,76, superando em 2021 o montante de 351 milhões de reais. Na última semana, foi editado o Decreto Federal nº 10.979/2022, através do qual novamente se instituiu a desoneração fiscal de IPI sobre a produção de automóveis e eletrodomésticos da linha branca, promovendo-se uma redução de 25% para a maior parte dos produtos e 18,5% para alguns automóveis. De acordo com cálculos informados pelo Ministério da Economia, esta medida de desoneração representará uma renúncia tributária de R$ 19,5 bilhões para o ano de 2022, de R$ 20,9 bilhões para o ano de 2023 e de R$ 22,5 bilhões para o ano de 2024.  A intervenção na economia através da desoneração tributária é habitualmente realizada pelo Governo Federal, porém, estas renúncias precisam respeitar as bases do federalismo fiscal. Assim, diante do cenário nacional enfrentado, polarizado entre pleno exercício da competência tributária da União e a garantia de efetiva autonomia fiscal dos estados e municípios, a transparência e efetivo controle dos incentivos fiscais são urgentes, devendo,  ainda, ser implementadas medidas de equalização federativa, realizadas através da adoção de medidas de neutralização para que os entes recebedores dos Fundos de Participação não tenham o comprometimento de sua autonomia federativa diante da ausência de recursos mínimos à sua manutenção básica e ao cumprimento de suas tarefas constitucionais obrigatórias.

BRASIL. Site TCU. Acórdão TCU n° 713/2014. Disponível em: https://contas.tcu.gov.br/etcu/ObterDocumentoSisdoc?seAbrirDocNoBrowser=true&codArqCatalogado=7836523. Acesso em: 02/03/2022.

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