Voz do Associado seg, 17 de janeiro de 2022
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Por: Nathália Tozetto,
Procuradora do Munícipio de Goiânia 
 
Atos de racismo no Brasil permeiam nosso cotidiano, nos acostumamos a não ver negros em posições socialmente favoráveis, ligamos a negritude à marginalidade.
 
O que é estar à margem?
 
A aclamada psicóloga portuguesa Grada Kilomba explica o que é estar a margem usando conceitos da psicanálise freudiana. Segundo a autora o homem branco usa a si mesmo como ponto de referência da normalidade da condição humana, como centro do que deve ser considerar certo - o restante é "à margem", com certeza a lista dos que estão "à margem" cresceu muito, mas desde a escravidão taxamos negros com aquilo que rejeitamos ser o ideal. 
Por isso a facilidade de julgamento e a aceitação da política de morte praticada contra essa parcela da população, não há outra palavra para denotar o tratamento relegado: lembremos o caso do ciclista e youtuber Felipe Ferreira negro abordado com truculência em uma praça na Cidade Ocidental (GO)... o recente episódio do jovem negro Jhonny Italo algemado em à uma moto e arrastado por um policial...
Episódios que mostram como acostumamos com o racismo estrutural e o consequente estado de exceção praticado contra os direitos dos negros.
 
Segundo dados do IBGE, 56% da brasileira é negra, mas continuam sendo 80% das pessoas em situação de pobreza no país. Esse status é fruto das condições de desprivilégio carregadas por esse povo ao longo da história, com as quais contribuímos ao negar a necessidade de políticas afirmativas reparatórias.
 
Exigimos do povo negro um esforço sobre-humano para conquistar oportunidades, esforços aos quais não queremos que nossos filhos tenham que se submeter. Buscamos e aplaudimos histórias extraordinárias de pessoas pobres que conseguiram grandes feitos (ex. o catador de papel que virou juiz...) para esconder nossa responsabilidade pela história de rebaixamento e pelo desconforto que é conscientizar-se sobre ela. A verdade é que poucos são os juízes negros porque as condições de pobreza não permitem que haja o tempo e os insumos necessários ao estudo para galgar tais postos.
 
Nesse contexto o jurista Silvio Almeida defende que o racismo não é um ato, mas um processo - em que as condições de organização da sociedade reproduzem a subaternidade de determinado grupo mediante uma maquinação estrutural dependente da atuação da política, do direito, economia e ideologia - o denominado racismo estrutural.
 
E é nesse contexto que surge a importância de falarmos sobre a política reparatória dessa evidente  desigualdade - a política de cotas raciais em universidades públicas brasileiras. Tal política tem previsão de vencimento no ano de 2022 e atualmente está sendo debatida no Congresso sua prorrogação (PL 4656/2020). 
 
Contexto que precisamos lembrar da importância da manutenção de tal política  como forma de conceder àqueles que historicamente possuem as piores condições, oportunidades efetivas para que consigam a melhoria...  para que assim evoluamos enquanto sociedade na melhoria da qualidade de vida de toda a nossa população.
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