Voz do Associado qua, 25 de janeiro de 2023
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Por: Carlos Augusto Vieira da Costa,
Procurador do Município de Curitiba. Ex-Presidente da ANPM

Sabidamente a análise de qualquer contexto histórico, para ser precisa, requer um certo distanciamento no tempo, a fim de filtrar eventuais excessos decorrentes da febre do momento.  Por isso, esse fenômeno vivenciado no Brasil nesses últimos tempos, ilustrado por pessoas apontando celulares para o céu a fim de captar a atenção de extras terrestres, ou por velhinhas e velhinhos em ordem unida em frente a quarteis num ato de exaltação cívica, ainda está por ser explicado.

De todo modo, uma coisa já dá para dizer: essas pessoas perderam a confiança na racionalidade iluminista que vem ditando as regras do mundo civilizado desde que Copérnico se atreveu a afirmar que a Terra é que  gira em torno do Sol, e não o contrário. E sem essa confiança, a vida em sociedade fica conturbada. Até os elefantes, que não são considerados racionais, sabem disso. Tanto assim que nos tempos de secas severas, a manada aceita ser conduzida pela  fêmea mais velha até a fonte de água mais próxima, e curiosamente essa  estratégia quase nunca falha, como comprova o fato dos  elefantes ainda  habitarem a savana africana.

E nós humanos, mesmo sem perceber, também seguimos lógica semelhante. Quando somos levados, por exemplo, a uma mesa de cirurgia, confiamos que os instrumentos foram devidamente esterilizados, mesmo sem conhecer o instrumentador e saber se é alguém responsável. Da mesma forma que, quando tomamos um ônibus para uma viagem noturna, acreditamos  que o motorista cuidou de descansar para estar apto a fazer a viagem sem dormir no volante. Ou seja, confiamos a nossa vida mãos alheias de pessoas que nunca vimos anteriormente, e das quais não temos qualquer referência.

Então como explicar essa desconfiança nas urnas eletrônicas, mesmo se tratando de um equipamento já testado por décadas, cuja preparação passa pelas mãos de centenas de pessoas, muitas delas altamente qualificadas,  sem qualquer evidência de que possa haver ou de que alguma vez tenha havido alguma fraude?

Não há explicação lógica, exceto se admitirmos o  rompimento com a racionalidade mencionada acima.  Por isso da importância de seguirmos apostamos na Democracia, pois a única certeza nisso tudo é que,  se a humanidade ainda não se extinguiu, muito se deve ao fato de que a  maioria segue acreditando nessa racionalidade que nos impede de, apesar de contrariados, montarmos acampamentos em frente a quarteis para invocar a intervenção de alienígenas.

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