O Supremo Tribunal Federal acaba de proferir decisão que deve merecer máxima atenção das municipalidades brasileiras. Confira o alerta do Procurador do Município do Rio de Janeiro Ricardo Almeida, consultor da ABRASF:
Requeri, pela ABRASF, o ingresso da entidade como amicus curiae no RE 581.947, interposto pelo Município de Ji-Paraná/RO. Nosso pleito foi recebido pelo Ministro Eros Grau como memoriais - uma vez que o processo já estava incluído em pauta. Visando a ampliar o escopo da atuação e defender os interesses dos Municípios brasileiros, habilitei-me também junto ao Prefeito e ao Procurador Geral do Município de Ji-Paraná para representar aquela municipalidade, apresentando memoriais e realizando sustentação oral no Plenário do Supremo.
A lei do Município de Ji-Paraná (Lei n. 1.199 de 31 de dezembro de 2002) é bastante precária, induzindo a conclusão de que a “TAXA” instituída tem como fato gerador o uso do solo e espaço aéreo municipais, apesar de ser enunciada como “taxa de licença” (exercício de poder de polícia). Realizei a sustentação defendendo ser a hipótese de típica Taxa (tributo) devida pelo exercício do poder de polícia, conforme memoriais distribuídos aos Senhores Ministros.
A atividade de ordenadora (fiscalizadora) da Administração Municipal fora reconhecida no Acórdão recorrido, mas nada disso demoveu o relator e demais ministros. Alegram que, a rigor, a Lei do Município de Ji-Paraná não preenche os requisitos constitucionais (art. 145, inciso II da CR88) e legais (art. 77 e 78 do CTN) para instituição de taxa. Não ficou claro quais destes requisitos não foram atendidos, o que ainda poderá ser objeto de embargos de declaração.
O voto do relator, entretanto, teceu outros argumentos preocupantes para as municipalidades - e que podem influir imediatamente no curso dos demais casos que envolvem preço público e estão sob a análise do STF. O primeiro argumento diz respeito à anunciada impossibilidade de cobrar retribuição pelo uso de bem público, considerado como bem de uso comum do povo, se não for caso de desapropriação.
Cogitou o Ministro Relator, Eros Grau, da existência de servidão administrativa, instituída pela Concessionária de Serviço Público de Distribuição/Comercialização de Energia Elétrica, no campo dos seus poderes administrativos de tal natureza, delegados pelo Poder
Concedente.
Esqueceu-se o relator de enfrentar a questão de que servidão administrativa só pode ser instituída mediante ATO FORMAL, sobretudo em se tratando de bem público (municipal).
Apesar da inexistência de atos formais de instituição de servidão, o Relator presumiu sua existência e, implicitamente, entendeu-a como gratuita. Afastou a possível onerosidade (da servidão) – também de maneira tácita - ao afirmar que o bem (público municipal) sobre o qual são instalados postes, cabos, etc, são bens de uso comum do povo, e assim continuam a ser, mesmo após a instalação.
Também aqui o eminente Relator esqueceu-se que o bem municipal ocupado, mesmo por equipamentos destinados à prestação de serviço público essencial ou de utilidade pública, fica desafetado do uso comum do povo, passando à posse direta da empresa concessionária privada, seja ela estatal ou particular.
O segundo argumento, que também preocupa, consiste no entendimento do relator – não comungado expressamente pelos demais ministros (salvo Peluso) – no sentido de que a tributação municipal invade a competência administrativa da União para prestar os serviços de energia elétrica – ainda que concedidos a terceiros.
Os Ministros Lewandowski, Carlos Britto, Gilmar Mendes e Carmen Lúcia fizeram ressalvas ao voto do relator lembrando que, se o Município de fato instituir em lei verdadeira taxa de polícia poderá cobrá-la, pois estará realizando sua competência administrativa constitucional. Esta ressalva resguardou as taxas de polícia sobre serviços públicos federais, mas é preciso obter as notas taquigráficas para que isto fique explícito em casos nos quais surja a discussão.
Estaremos, com este propósito, apresentando embargos de declaração, visando a tentar aclarar melhor o tema.
De qualquer sorte, afigura-se importante que as Procuradorias Municipais estejam atentas a estes detalhes do precedente, evitando que surjam novas decisões do Poder Judiciário desfavoráveis à cobrança de taxas de polícia quando o administrado/contribuinte for pessoa jurídica estatal ou privada prestadora de serviço público federal ou estadual.
Assim, algumas providências estão sendo tomadas:
1. Aceleração dos julgamentos (nos casos em que a ABRASF já está mantida como amicus curiae) e dos pedidos já formulados desta entidade como amicus curiae em nos casos em que se discute a possibilidade de cobrança de PREÇO PÚBLICO pelo uso de bens públicos municipais por terceiros, inclusive concessionárias de serviços públicos federais;
2. Despacho com os ministros relatores destes casos para que não apliquem cegamente o precedente firmado com REPERCUSSÃO GERAL neste RE 581.947 a estes casos (de preço público), de modo a evitar trabalho junto aos Tribunais Estaduais para que reenviem estes casos aos STF para apreciar questão não abrangida pelos efeitos do precedente hoje julgado.
3. Recomendação às municipalidades que tiveram sobrestados ou baixados ao Tribunal de origem seus recursos sobre o tema do preço público pelo uso do solo, subsolo, espaço aéreo, etc, que desde já requeiram a não aplicação do precedente, pois distinto da discussão – o que é o caso já detectado do Rio de Janeiro, no Agravo de Instrumento em Recurso Extraordinário n. 654.583.
Referências: Ricardo Almeida - Procurador do Município do Rio de JaneiroA ANPM luta pelo aperfeiçoamento da gestão pública municipal e para a valorização profissional dos procuradores. Por isso, associar-se a ANPM é fundamental para todo procurador municipal.
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